"WAVES" - 2019
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Um filme belo e magnífico do jovem diretor Trey Edward Shultz. Ele já havia surpreendido o público com o amedrontador “Ao Cair da Noite” de 2018, mas agora ele constrói um drama familiar extremamente humano que demonstra que as nossas ações ressoam como ondas transformando todos os que estão a nossa volta.
O filme conta a história de Tyler (Kelvin Harrison Jr. excelente) um jovem negro que pratica luta greco-romana. Ele é popular no colégio, namora a garota mais bonita, Alexis (Alexia Demie) e tem um futuro brilhante pela frente. Ele mora numa grande casa em um bairro chique de Miami com seus pai Ronald (Sterling K. Brown sempre magnífico) e sua madrasta Catherine (Renée Elise Goldsberry fantástica), além de sua irmã apática Emily (Taylor Russell McKenzie).
A aparente vida perfeita de Tyler começa a ruir aos poucos após uma lesão no ombro, que lhe causa dor para treinar. No entanto, isso não impede que ele continue os treinos e as lutas, anestesiado opióides e impulsionado pela cobrança desmedida do pai, que tem a desculpa de não saber da doença do filho.
Os acontecimentos evoluem em uma espiral descendente devido a pequenas escolhas equivocadas do protagonista, que sob pressão de todos os lados desconstrói sua vida quebrando todos os laços com que tem a sua volta. Tudo culmina num evento trágico que o transforma em uma monstruosidade aos olhos dos outros, mas somente o público consegue perceber a lenta transformação de Tyler, como se esculpido e revelado pelas ondas de choque que o atinge e sua reação equivocada.
A câmera do diretor consegue transformar as ondas e a espiral da narrativa em longos e poéticos planos sequências rotacionais, sejam nos momentos de alegria com amigos dentro do carro ou de solidão e tristeza dentro do carro. A própria luta greco-romana é um símbolo desses ciclos, onde dois lutadores se enfrentam dentro de uma arena circular, ambos rodando e dançando dentro desses círculos, tentando desequilibrar o outro através de uma combinação de força centrípeta e energia estática. Durante esses curtos períodos de equilíbrio de forças, os lutadores se desgastam em um estado de pseudo-inércia. Vence o jogo, aquele que se usufruir de mecanismos de alavanca alimentados pela ação e reação do oponente.
Através de um longo fade out chegamos ao meio da história, onde o diretor ousa a inserir um audacioso plot twist ao abandonar seu protagonista e voltar seus olhos para um personagem até então apenas secundário.
Começamos a acompanhar vida, aparentemente monótona de Emily, que viva as sombras do ilustre irmão, tanto em casa como no colégio. Se nada era fácil para a irmã mais nova, tudo se tornou um pesadelo silencioso após a tragédia causada pelo irmão.
A bela família se desintegrou, os minguados amigos de Emily a abandonaram e ela sofre em silêncio ignorada por todos, cada um deles cegos pela própria dor e culpa. A inserção de um novo personagem Luke (Lucas Hedges sempre eficiente), consegue despertar um novo horizonte na vida da solitária garota.
Os traumas do passado de Luke consegue demonstrar que mesmos as pioras ondas de choque que destroem nossa felicidade e esperança podem servir para iluminar o caminho de outras pessoas. Alguns vão dizer que é o velho papo de que se a vida lhe fecha uma porta, também abre uma janela.
No entanto, acredito que a vida somos nós mesmos e nossas ações. Nunca estaremos totalmente isolados no mundo, mesmo em verdadeiras catástrofes. Nossas escolhas e ações sempre ressoarão em algo ou alguém, isso transforma a vida do outro de alguma formas, as vezes para melhor e as vezes para pior.
Para mim as outras pessoas são como as ondas do mar. A gente mergulha nesse oceano de vida, as ondas ou pessoas passam pela gente. Algumas vezes essas ondas levam nossas sujeiras nos deixando mais limpos, as vezes elas nos contaminam e saímos do mar mais sujos do que quando entramos. No entanto, sempre será impossível sair inerte do choque com essas ondas, se nem as pedras consegue resistir, o que dirá nós seres humanos que somos feitos de carne e osso. Impossível não se emocionar com o impacto dessas ondas.
Crítica por: Fabio Yamada.
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