"SERVANT" - 2019 - ...
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Uma série de mistério e suspense com algumas pitadas de sobrenatural que consegue surpreender o espectador que souber apreciar a atmosfera criada por Tony Basgallop e que tem a produção executiva (ou griffe) de M. Night Shyamalan.
A série da Apple TV com episódios curtos de no máximo 30 minutos acompanha a história de Dorothy (Lauren Ambrose) que perdeu seu bebê. Ela é uma importante repórter de um jornal da TV e casada com o chef de cozinha Sean (Toby Kebbell). Após o incidente com o filho, Dorothy entre em depressão profunda e seu marido e o irmão Julian (Rupert Grint) decidem utilizar o boneco “reborn”, um tipo de boneco recém-nascido bem realista como substituto para Jericho, o bebê recém falecido.
Inicialmente, a depressão de Dorothy melhora com a introdução do boneco na vida da família, todos fazem questão de sustentar temporariamente aquela dinâmica familiar distópica como forma de superar o luto. Dorothy então decide retornar ao trabalho e planeja contratar uma babá para cuidar de Jericho. A escolhida acaba sendo a desconhecida Leanne (Nell Tiger Free), que embarca de cabeça na loucura da família.
No entanto, em um determinado dia o boneco acaba ganhando vida e tornando-se um bebê de verdade. Todos são pegos de surpresa, menos Dorothy que já acreditava que o boneco era realmente um bebê. Sean e Julian começam a desconfiar que Leanne trocou o boneco por um bebê real e começam a investigar e perseguir a babá misteriosa.
O cenário de quase todos os eventos da série acaba sendo a própria residência de Dorothy e Sean. O elenco com a inserção de um ou outro coadjuvante acaba restrito ao quarteto principal e o bebê é claro. A casa por si só com vários andares, corredores, cômodos, sótão e porão, transforma-se em um imenso labirinto capaz de potencializar a loucura e desespero dos personagens que não sabem ao certo no que acreditar.
O tema do luto já foi abordado diversas vezes no cinema e na TV das mais diversas formas, mas a idéia de se utilizar desse sinistro e perturbador boneco como ponto central da trama é realmente inovador. Várias surpresas acabam surgindo no decorrer da trama, algumas envolvem o verdadeiro motivo da loucura e culpa de Dorothy e outras o envolvimento de uma seita que ajuda aqueles que perderam seus entes queridos.
O boneco acaba se tornando uma metáfora para o serviço prestado pela seita da qual Leanne faz parte, afinal ambos tem a função de amenizar o luto e a perda. Outro filme que abordou o tema de forma bastante inventiva foi “Alpes" do visionário diretor grego Yorgos Lanthimos, onde um grupo de pessoas personificavam recém falecidos, afim de ajudar seus clientes durante o processo de luto.
Cada um de nós tem as seus formas de encarar os diferentes tipos de perdas e lutas com as quais nos deparamos durante nossa existência, alguns entram em depressão, outros se lançam em um processo fuga contínua, outros sentem a necessidade de acreditar em algo maior afim de amenizar a dor e alguns necessitam de um tipo de substituto para atravessar seus momentos mais sombrios.
Acredito que o mais interessante em todos esses processos seja a capacidade da nossa mente de nos enganar de alguma forma, seja em acreditar em algo que realmente não existe, criar uma realidade distópica ou ignorar aquilo que nos causa mais dor. Se realmente a nossa mente tem esse poder de destruir, mesmo que temporariamente, os pilares mais sólidos da razão em momentos de puro desespero e dor, fico imaginando o que ela não pode fazer cronicamente com aqueles que não tem nenhum tipo de perspectiva ou esperança de uma vida melhor. Assim fica mais fácil de entender ou compreender o comportamento irracional e ininteligível de algumas pessoas que se recusam a encarar a realidade a sua volta, preferindo acreditar e defender mentiras deslavadas. Sempre acreditei que fosse por ignorância ou desconhecimento, mas agora começo a entender que se trata apenas de dor e desesperança, um tipo de luto pela própria vida.
Crítica por: Fabio Yamada.
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