Crítica: Polytechnique

"POLYTECHNIQUE" - 2009

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O diretor canadense Denis Villeneuve realmente é dos maiores diretores e criadores cinematográficos das últimas décadas. Além da qualidade de seus filmes e da profundidade dos temos debatidos neles, salta aos olhos a versatilidade com a qual ele navega por entre os diferentes gêneros cinematográficos.

Esse filme que remonta a enorme tragédia real ocorrida em 1989 na Escola Politécnica de Montreal é mais uma prova de sua versatilidade. Ele não somente expõe um caso atroz de violência mas também debate o absurdo de pensamentos e crenças vigentes na época e que podem ter nos levado ao ponto no qual estamos hoje.

Não existe e nunca jamais existirá qualquer desculpa ou justificativa para um gesto de violência desse tipo, mas vale a pena entender a origem desse pensamentos patológicos para tentar de alguma forma previnir tragédias futuras, reduzir as perdas e amenizar o trauma de quem sofre ou sofreu algo do tipo.

Na época de lançamento do filme, muitos criticaram a escolha sobre a realização filme, como se o diretor estivesse revivendo o sofrimento das vítimas e parentes. No entanto, ao meu ver, acredito que um trauma desse não tem como ser esquecido e que as cicatrizes e memórias deles jamais se apagam na mente e corpo de suas vítimas. Os únicos que conseguem esquecer ou sublimar um trauma desses são aquele que não querem ver o que acontece a sua volta. E é justamente para esses cegos que não querem enxergar que é feito esse tipo de lembrete ou alarme, aqueles que desejam apagar da história algo mostre algo tão terrível que de alguma forma germina por entre nossos tão frágeis elos de empatia.

O diretor opta por uma linguagem não linear e por uma fotografia em preto-e-branco que ao mesmo tempo ameniza o vermelho do sangue das vítimas mas ressalta um tom documental e verídico que a história tanto precisa.

Vários filmes sobre tragédias semelhantes já foram realizados, desde o documentário “Tiros em Columbine” de Michael Moore e “Elephant" de Gus Van Sant. No entanto, o filme predileto sobre algo do gênero, que na verdade não se baseia em nenhuma tragédia específica é “Man Bites Dog” de 1993, dirigido por um Benoit Poelvoorde, Rémy Belvaux e André Bonzel, também opta pela fotografia em preto-e-branco, cuja história se passa em torno de um grupo de cineastas amadores acompanham a rotina de um serial killer como se fosse um documentário. A metáfora entre quem aprecia, divulga ou acompanha esse tipo de violência e acaba também por participar e gerar violência é perfeita, jogando o expectador em meio a um caldeirão de reflexões auto-referenciais.

Na história de Villeneuve, temos alguns personagens principais como Jean-François (o belo Sébastien Huberdeau) e Stéphanie (Evelyne Brochu). No entanto, o embate central está entre dois personagens, o atirador (Maxim Gaudette) e Valérie (Karine Vanasse), o primeiro sendo o atirador responsável pelas mortes das mulheres e a segunda uma das sobreviventes da tragédia.

A trama é acompanhada de duas narrações em off principais, a primeira com as palavras de uma carta escrita pelo assassino para a mãe sobre os seus pensamentos e desculpas pelas suas ações cruéis e a segunda escrita por Valérie, anos após a tragédia, também para a mãe do assassino, tentando explicar o processo de cura pelo qual está passando e sobre seus medos ao estar gerando uma nova vida dentro de si.

Um filme corajoso que não se limita a expor a violência ou criar histórias melodramáticas para enaltecer as vítimas da tragédia e muito menos tenta criar explicações descabidas para os assassinatos, mas que tenta de alguma forma mostrar de alguma forma as consequências da violência daquele dia e da rotina das vidas de todas as mulheres.

Um importante ponto salta aos olhos de quem vê o filme, a inércia ou inação de todos os alunos do gênero masculino daquela escola, que diante da tragédia onde um assassino tinha como alvo todas as alunas da faculdade, limitaram-se a se esconder e fugir dos tiros disparados. Coube ao personagem de Jean-François tenta demonstrar que alguns dos alunos esboçaram algum tipo de reação contra o assassino, mas que em momento algum resultou no salvamento de nenhuma de suas vítimas, gerando talvez um trauma psicológico mais avassalador do que a violência física nas vítimas fatais.

Jamais precisaremos ser os heróis da história de ninguém, mas cabe a cada um de nós não se tornar o vilão de nossas próprias vidas.

Crítica por: Fabio Yamada.

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