"A MÃO DE DEUS" - 2021
🔑🔑🔑🔑
Eu tenho que admitir que adoro os filmes do Paolo Sorrentino. Alguns podem dizer que ele é um exibicionista que tenta copiar Federico Fellini, mas pouco me importa. Eu já assisti inúmeras vezes “A Grande Beleza” e não me canso de me emocionar com as belas imagens com as quais ele retrata uma Roma decadente e hipócrita.
No entanto, eu me irrito profundamente com essa moda dos meus diretores prediletos resolverem criar filmes com ou sobre a vida de Maradona. Se já não bastasse Emir Kusturica ter realizado aquele infame filme de 2008, agora vem o diretor italiano e faz esse filme. Eu estava torcendo muito o nariz para esse filme. No entanto, tenho que dizer que ele nada quase tem a ver com o ídolo argentino, tirando o fascínio que o protagonista da história e alter-ego do diretor tem pelo jogador.
O filme que é uma espécie de autobiografia ficcionada de Sorrentino, mistura acontecimentos reais com pitadas de muita imaginação. Nele, acompanhamos a vida de Fabietto (Filippo Scotti) e sua família, composta pelo pai Saverio (Toni Servillo), pela mãe Maria (Teresa Saponangelo) e pelo irmão Marchino (Marlon Joubert), além de mais um sem número de outros parentes e amigos.
Todo o filme se passa praticamente na cidade litorânea de Nápoles à beira do Vesúvio, cidade natal do diretor. É incrível como Sorrentino consegue transforma aquela cidade de aspecto decadente e sujo em lugar aconchegante e fascinante. Estamos mais precisamente na década de 80, logo após aquele fatídico gol feito com as mãos pelo argentino na Copa do Mundo de 1986.
Imediatamente, o jogador do time do Barcelona se transformou em um ídolo mundial, sendo transformado em deus do futebol. Todos os fãs do esporte o queriam em seu time do coração e Fabietto e seu irmão sonhavam com a idéia do argentino vir a jogar no time da cidade.
Inusitadamente, talvez por causa do escândalo do gol com a cabeça do argentino e com a mão de deus, Maradona acaba sendo comprado pelo time napolitano. Em meio a esse imbróglio futebolístico, vamos conhecendo a disfuncional família de Fabietto e suas desventuras. Marchino é um aspirante a ator que realiza teste de figuração para os filmes de Fellini. Maria adora pregar peças em todos a sua volta, inclusive e seu marido que tem um caso amoroso de anos com sua assistente e na baronesa que mora no andar de cima. Seu tio Franco (Massimiliano Gallo) morre de ciúmes da bela esposa Patrizia (Luisa Ranieri) que se torna a musa da adolescência do protagonista. O avô Alfredo (Renato Carpentieri) é responsável pelas melhores tiradas do filme.
Devido ao furor pelo jogador argentino, Fabietto acaba se salvando de uma inusitada tragédia familiar, sendo salvo pela “mão de deus”. Ele começa a repensar seus interesses de vida forçado pelo luto. O interesse pelo futebol e seu ídolo dão lugar ao fascínio pelo cinema. O diretor faz então referência a mestres do cinema italiano como Franco Zeffirelli (várias vezes citado), Federico Fellini (que tem uma fala no filme) e Antonio Capuano (que acaba tendo um papel importante na vida do protagonista).
Recheado de belos planos sequências e com uma fotografia iluminada, Sorrentino nos revela um pouco mais linear, mas sem deixar seus realismo mágico com toques surrealistas, sejam nos personagens inusitados como, a garota que nunca sai do banheiro, o noivo que usa equipamento de voz robótica ou o encanador que é uma caricatura do Super Mário.
A arte existe porque a vida nem sempre é suficiente, mas para alguns o cinema existe como pura fuga da realidade. As vezes realmente precisamos fugir e nos perder para podermos nos encontrar. Aqueles que retornam de seus sonhos conseguem enlatar seus pensamentos e visões e oferecer para os outros, alguns chamam isso de arte. No entanto, existem aqueles que nunca retornam de seus sonhos e geralmente não tem nada a oferecer para os outros, alguns chamam isso de loucura. Eu vivo entre a loucura e o sonho, acreditando que tenho algo para oferecer para os outros.
O diretor apresenta em seus filmes esse dilema entre sonho e loucura de personagens que estão sempre a procura da arte que complementara suas vidas de felicidade. No entanto, acredito que a arte na maioria das vezes surge da dor de um vazio sem fim, que quase nunca satisfaz quem a produz, mas que serve para entreter e fascinar quem a consome.
Crítica por: Fabio Yamada.
Comentários
Postar um comentário