Crítica: The Feast

"THE FEAST" - 2021

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Um filme que pode ser enquadrado no novo sub-gênero do terror, o terror ecológico. Onde a natureza se empodera, reagindo a civilização e despejando toda sua ira sobre os seres humanos. Uma referência ao o que poderia ser chamada de Hipótese de Gaia, onde o ser Terra decide erradicar toda a humanidade.

No belo filme dirigido por Lee Haven Jones, adentramos para o microcosmos de uma abastada família galesa que organiza um jantar em sua casa de campo. Toda a ação decorre em um único dia, acompanhamos a mãe protetora e esposa dedicada Glenda (Nia Roberts), preparar jantar, desde a escolha minuciosa de cada elemento até a organização da mesa. O esforço do filho Guto (Steffan Cennydd) em cortar a lenha, sendo que ele está isolado na casa para se recompor de uma recente internação. A obsessão física e narcisista de Gweirydd (Sion Alun Davies) que pratica esportes, depila incansavelmente o corpo e não cansa de se olhar no espelho. Além é claro do político e caçador Gwyn (Julian Lewis Jones) que tenta manipular e abusar de todos a sua volta.

No entanto, essa inusitada estruturação familiar que parece estar patologicamente equilibrada em seus relações de simbiose e parasitismo com a sociedade ao seu redor é abalada com a chegada da silenciosa e servil Cadi (Annes Elwyn). A ajudante de última hora de Glenda para o jantar, chega caminhando calmamente pela estrada no meio do campo, com a camisa branca amarrotada, cabelo despenteado e cara amassada, como se tivesse acabado de despertar.

Cadi com sua aparência cândida e personalidade ingênua começa a interagir e seduzir cada um dos habitantes daquela casa, que mais parece um labirinto, graças a cenografia, fotografia e montagem cuidadosa do filme, que transforma uma simples casa de tijolos no campo em um verdadeiro castelo medieval.

A nossa bela intrusa vai ganhando forma e modificando sua silhueta através da interação com seus interlocutores. Aquela garota que mais parecia uma página em branco, vai ganhando cores e dimensões. Ela aprende a preparar os pratos e a mesa com Glenda. Ela fica atordoada com a beleza de Gweirydd e começa a se olhar no espelho também. Ela se impressiona com a música da guitarra de Guto e começa a cantar. Ela se assusta com os disparos da arma de Gwyn e se horroriza com os coelhos mortos em suas mãos, mas aprende a ser agressiva quando atacada. 

Pequenos detalhes da trama se associam com cuidadosos planos surpreendentes que evocam a destruição da natureza e sua revolta em contra-partida. Seja na máquina que extrai o petróleo no campo, a máscara de carvão no rosto de Glenda, o retiro murado da casa, a terra que se esvai da pele de Cadi, as alucinações de Guto, o desejo de Gweirydd, a fome insaciável de um convidado, além da trilha sonora soturna e implacável.

Desde o início do filme sabemos que existe algo de errado com aquela estranha e silenciosa invasora, mas esquecemos de notar, talvez por estarmos tão bem habituados, que os elementos tenebrosos do filme são cada um dos membros daquela deplorável e ignóbil família.

Uma pequena brincadeira do diretor/ roteirista no meio do filme resume grande parte do comportamento destrutivo do homem em relação à natureza. A protagonista explica para uma convidada o verdadeiro significado da pintura pendurada na parede de sua sala, ela comenta que alguns observadores acreditam tratar-se de arte abstrata que significa esperança de um mundo melhor, mas que na verdade nada mais é do que a planta baixa de sua propriedade com as áreas de extração de minerais e pedras preciosas. Uma verdadeira desconstrução e metáfora em relação a dita “natureza morta”. Ao final somos presenteados com o verdadeiro banquete do filme, um verdadeiro show de horrores, onde nós somos o prato principal da mãe natureza.

Crítica por: Fabio Yamada.

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