Crítica: E Então Nós Dançamos

"E ENTÃO NÓS DANÇAMOS" - 2021

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Uma co-produção sueca e georgiana que aborda temas aparentemente batidos na cinematografia ocidental, como a homossexualidade que surge em meio ao universo da dança, mais especificamente entre dois bailarinos.

No entanto, a história situa-se na Geórgia, uma das antigas nações que faziam parte na União Soviética, cuja a religião do cristianismo ortodoxo condena a homossexualidade, no entanto, essa nação tentou a todo custo se aproximar da União Européia e da OTAN, assim homologando leis de combate a homofobia que na prática ainda não funcionam. Além disso, não estamos falando de qualquer tipo de dança ou ballet, mas sim da dança típica georgiana que exalta a força e masculinidade de seu povo. 

Então apesar de parecer um coisa trivial aos nossos olhos ocidentais, na verdade, a dança acaba sendo um elemento controverso nessa história de amadurecimento do jovem dançarino Merab (Levan Gelbakhiani fantástico). Ele sustenta sua família com o salário que recebe como garçom do restaurante no qual trabalha à noite e sonha em mudar de status social através da dança e a possibilidade de uma audição para compor o National Georgian Ensemble.

Desde o início do filme percebemos que Merab não se encaixa perfeitamente nesse cenário, seja pela difícil relação com seu irmão Rati (Dachi Babunashvili), pela incômoda falta espaço físico em sua casa, pela atrapalhada relação com sua suposta namorada Mary (Ana Javakishvili) ou pela falta de compasso e leveza em sua dança. 

No entanto, após a chegada de Irakli (Bachi Valishvili lindo) os caminhos e a vida de Merab se iluminam e apesar dos dois serem teoricamente concorrentes pela mesma vaga como dançarino, eles começam a ensaiar passos de dança juntos. O tema da homossexualidade surge em planos secundários através de cruéis relatos sobre a vida de personagens secundários.

Um homem quando começa a sentir atração por outro homem, nem sempre se rotula logo de cara como homossexual, mesmo por que essa atração muitas vezes acaba sendo muito mais afetiva do que sexual propriamente dita. A atração se mistura com um misto de admiração, amizade e companheirismo. Isso o filme consegue demonstrar muito bem. 

Num universo como o nosso (ocidental), as liberdades e os excessos conseguem camuflar tudo isso, deixando o sentimento um pouco de lado e indo direto para o lado sexual. Muitas vezes temos que usar a sexualidade para atrair o parceiro e somente depois disso perceber se existe algum tipo de sentimento por baixo de tudo aquilo. Funciona como se tivéssemos que percorrer o caminho inverso, não que eu esteja condenando esse tipo de comportamento, que sou eu para isso, mas trata-se apenas de um outro tipo de roteiro para o amor. Não necessariamente mais certo ou errado, mas os exageros acabam sempre por nos cegar ou anestesiar.

O filme passa por toda a epopéia com garoto inocente apaixonado que arrisca tudo pelo amado, mas que tem perseverança para dar a volta por cima e apresentar sua dança na audição final. No entanto, não estamos diante de nenhum “Flashdance gay”. 

Os números de dança, sejam no estúdio de dança, nas festas ou na rua da capital Tbilisi são extremamente bem filmados e belos. Sabemos desde o início que não haverá uma redenção (não aquela típica dos filmes hollywoodianos) para o nosso querido e sofrido dançarino, mas não existe como não se emocionar e derramar lágrimas nas cenas final de dança. Um belo filme sobre o universo homossexual que não tem nada de trivial e que consegue resgatar algumas coisas que podemos ter esquecido pelo caminho.

Crítica por: Fabio Yamada.

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