"BENEDETTA" - 2021
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Um filme baseado em uma história real sobre uma freira lésbica que viveu século XXVII e que quase virou uma santa. O roteiro é baseado no livro acadêmico “Atos Impuros: A Vida de uma Freira Lésbica na Itália da Renascença” de Judith C. Brown.
No filme do octagenário, mas sempre revolucionário, Paul Verhoeven, acompanhamos a vida da personagem Benedetta Carlini (Virginie Efira maravilhosa) que desde criança havia prometido sua vida para igreja. Seus pais a entregam de bom grado ao mosteiro, não sem antes discutirem sobre a quantia a ser deixada como dote para a igreja, afinal ela um dia se tornará a noiva de Cristo e mesmo por que a igreja, como bem diz uma personagem, “não é uma instituição de caridade”.
O diretor holandês é conhecido por seus polêmicos filmes anteriores, seja na sua fase européia com “Louca Paixão” de 1973, “Sem Controle” de 1980, ‘O Quarto Homem” de 1983 e “Conquista Sangrenta” de 1985, até os sucessos hollywoodianos como “Robocop" de 1987, “O Vingador do Futuro” de 1990, “Instinto Selvagem” de 1992, mas que também teve seus grandes fracassos de crítica e bilheteria como “Showgirls" de 1995 e “Tropas Estelares” de 1997. Em 2016, Verhoeven voltou a ser aclamado pela crítica com o perturbador “Elle" com a maravilhosa Isabelle Huppert.
Os filmes de Verhoven geralmente possuem uma roupagem pop com linguagem publicitária e ritmo de videoclip, mas sempre discutem temas espinhosos para sociedade. Nesse seu último trabalho não seria diferente, ele se utiliza da história verídica de uma freira que sofria de alucinações e distúrbios psíquicos que quase foi condenada à fogueira devido a um suposto caso amoroso com outra mulher, para criar uma bela fantasia erótica que explora o desejo feminino em contra-ponto a repressão religiosa.
A protagonista da história, a tal Benedetta caminha no fio da navalha, horas tendendo a heroína Joana D’Arc, horas decaindo para vilania de uma mulher manipuladora usurpadora de milagres. Independente do que tenha sido na realidade, a construção dessa contraditória personagem que amamos odiar é maravilhosa. Virginie Efira consegue criar uma mulher forte e inteligente que inicialmente sofre ao não aceitar seus impulsos sexuais, mas que se entrega fervorosamente a religião.
Na história em si, Benedetta cresce e torna-se uma mulher dentro do mosteiro, sua rotina é surpreendida e modificada após a chegada de Bartolomea (Daphne Patakia), que tenta a todo custo seduzi-la. Benedetta tenta apaziguar seu desejo através da dor física e dos sonhos maravilhosamente kitsch que ela tem com um Jesus vestido com armadura e montado em um cavalo que empunha sua espada para livrar Benedette de enormes serpentes que insistem em penetrar em seus orifícios.
Após ceder aos seus desejos sexuais, Benedetta começa a acreditar ou tenta fazer com que os outros acreditem em seus milagres, seja através das chagas que surgem em seu corpo ou da proteção da cidade contra a Peste que assola toda a Europa. Tanto o público, quanto aos outros personagens da história nunca chegam a uma conclusão sobre a veridicidade dos poderes miraculosos de Benedetta, mas isso não é o mais importante da história. As interrogações e o terreno movediço que advém dessa narrativa são um terreno fértil para o talentoso diretor/ roteirista tecer críticas voluptuosas sobre a igreja, o fanatismo, as fake news, o falso puritanismo e a intolerância. Tudo isso é claro envolto em belas cenas sensuais entre duas mulheres, com direito a muita nudez, uma imagem da santa virgem que se transforma em consolo erótico e sem falar na presença magnética de Charlote Rampling como a arqui-rival da nossa noviça rebelde.
Crítica por: Fabio Yamada.
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