"A GAROTA DO TAMBOR” - 2018
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Um trabalho fantástico de Park Chan-Wook baseado num livro de John Le Carré. O diretor coreano famoso por seus filmes cruéis sobre vingança filmando uma história de espionagem que envolve agentes do Mossad perseguindo terroristas árabes na Europa, você pensa em algo extremamente explosivo. Na verdade, não. A única coisa que explode e se quebra é a sua arrogância de espectador comum de achar que existe certo e errado, que uma história tem apenas dois lados.
Eu não li o livro de John Le Carré e nem assisti ao filme com Diane Keaton de 1984, mas este seriado de Park Chan-Wook, já te surpreende pela abertura, através de imagens que evocam o que não é mostrado, das cores alegres que contrastam com imagens solitárias. Um estado suspenso em contradição, na dúvida entre o ir o e vir.
Poderíamos comparar com outro seriado recente Hunters produzido por Jordan Peele, que não chega a ser ruim, sobre judeus vítimas do holocausto e seus descendentes caçando e matando nazistas que imigraram para os EUA. São duas histórias que tentam questionar os métodos utilizados pelos judeus para perseguir e eliminar seus inimigos sempre apoiados e justificados pelos acontecimentos da Segunda Grande Guerra. Os resultados cinematográficos das duas produções de época são completamente diferentes, lá tínhamos a visão do peso dessa tragédia sobre as gerações futuras e aqui temos a visão do europeu estrangeiro alheio ao conflito.
A história começa com um atentado a um diplomata israelense, que destrói sua casa e mata seu filho. A bomba é entregue por uma garota européia convertida a causa árabe. Um espião-mestre chefe do Mossad, Marty Kurtz (Michael Shannon fabuloso) entra em cena em uma caçada aos terroristas palestinos e seus colaboradores.
Nessa empreitada, eles arregimentam Charlie (Florence Pugh deslumbrante e poderosa), uma atriz inglesa que por seus pensamentos liberais e ligações com radicais palestinos se torna a candidata perfeita para se infiltrar entre os terroristas. No entanto, uma característica a torna mais especial, Charlie ficciona a própria vida. Ela conta histórias sobre seu passado muito mais dramáticas e traumáticas. Uma ficção que combina mais com ela do que a ordinária e suburbana realidade. A arte de ficcionar a própria vida. A mentirosa perfeita. Acho que todos fazemos um pouco disso, criando narrativas melhores que justifiquem nossos atos.
Nesse ponto surge Joseph ou Gadi (Aleksander Skargard esplêndido), um agente do Mossad que seduz Charlie, criando uma versão alternativa de Michel, o terrorista responsável pelo atentado em Berlin. Michel é irmão do líder terrorista palestino Khalid, alvo de Marty. Joseph trabalha com o emocional e a psique de Charlie, fazendo com que ela se apaixone por ele, mas ao mesmo tempo pela persona de Michel. Charlie agora torna-se a namorada do terrorista e se infiltra no grupo palestino afim de encontrar Khalid.
A grande questão da história é se Charlie se identificou demais com a questão árabe e passou para o outro lado. Ela está realmente apaixonada por Michel ou por Joseph? Ela vai entregar a bomba? Até que ponto ela realmente acredita na ficção de sua vida? Qual a narrativa Charlie vai escolher?
Uma frase proferida pelo personagem do terrorista Michel no meio do seriado é extremamente profunda. “Quando cheguei a Europa, o que realmente me espantou não foi o estilo de vida dos europeus. Mas, sim, perceber que eles realmente não se importam com que o que está acontecendo.”
Toda a construção do seriado é no sentido de nos identificarmos com a questão palestina, mostrando os terroristas como heróis românticos e os agentes judeus retratados com certa antipatia. Realmente, começamos a torcer para que Charlie passe para o outro lado. No entanto, o final aterrador consegue ser mais surpreendente. Mostrando que a realidade pode ser mais cruel que a ficção e que realmente não nos importamos com o que acontece com os personagens retratados todos os dias na tela da TV durante os noticiários diários.
Crítica por: Fabio Yamada.
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