"ADMIRÁVEL MUNDO NOVO" - 2020
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Uma surpreendente série sobre uma sociedade distópica futurista baseada em um livro escrito pelo filósofo Aldous Huxley em 1932. Ao assistir cada capítulo do seriado, não consigo deixar de lembrar de uma frase que li há algum tempo, de que nada envelhece mais rápido do que o futuro. No entanto, o texto no qual o roteiro da série é baseado consegue subverter completamente essa citação, conseguindo vislumbrar uma sociedade futurista não muito distante de nossa realidade.
Claro que precisamos contextualizar o período em que o livro foi escrito, no período entre Guerras, logo após a Queda da Bolsa de 1929, antes da ascensão de Hitler e logo após a Revolução Russa. Um mundo onde alguns condenam o capitalismo e outros se amedrontam com a ameaça do comunismo, um terreno propício para a ascensão do fascismo. Incrível, como esse admirável mundo vive em ciclos apesar de alguns acreditarem que a terra é plana.
Tanto no livro quanto na série, o cenário principal retratado por Aldous é uma Nova Londres que se tornou uma sociedade hedonista dividida em castas para potencializar a produção e a riqueza, onde todos tem a capacidade e obrigação de se sentirem felizes. Não existem mais instituição privadas, todos trabalham pelo bem comum da sociedade como um todo. Para tanto não existem mais casamentos e nem famílias, todos são de todos, as pessoas são proibidas de serem monogâmicas e de terem filhos, afinal somos todos irmãos. A tecnologia é empregada para produzir e modificar os embriões, que são incubados e as crianças educadas nos “Centros de Incubação e Condicionamento”. Portanto, cada ser humano é produzido geneticamente para ser agrupado em um tipo de classe (A, B, C e etc), suas habilidades, desejos e comportamento são modificados geneticamente e condicionados para cumprirem seu papel na sociedade. Nenhum ser humano precisa mais lidar com nenhum tipo de dor ou frustração, as emoções são controladas e amortizadas com drogas chamadas de “Soma”, tendo cada uma das pílulas cores com funções diferentes.
Portanto, nessa dita sociedade futurista, temos pessoas que são modificadas geneticamente, condicionadas conforme os que estão a sua volta, educadas através de veículos de massa e propagandas de marketing, cada um dentro de sua bolha com funções diferentes dentro da sociedade, utilizam-se drogas para amortizar seus sentimentos e lançam-se em festas e orgias hedonistas para passarem o tempo. Tão diferente do que vivemos hoje não?
Na história acompanhamos as vidas perfeitas de Lenina (Jessica Brown Findlay) que faz uma audaciosa B+, Bernard (Harry Lloyd) um frustrado A+ e Henry (Sen Mitsuji) um aparentemente controlado e satisfeito A+, um triângulo amoroso em meio a festas orgiásticas. No entanto, a paz e tranquilidade desses personagens é afetada após um excursão de Lenina e Henry para um parque temático onde os ditos “selvagens" apresentam números que remontam seus comportamentos primitivos, como casamento, maternidade, crimes e assassinatos. Um grupo de terroristas selvagens sequestram e assassinam os membros da excursão turística. No entanto, Lenina e Henry, acabam sendo salvos por John (Alden Ehrenreich) e sua mãe Linda (Demi Moore sempre linda). O selvagem John acaba fugindo para a Nova Londres e tendo que se inserir nessa sociedade, mas acaba sendo como um vírus inoculado em um organismo sem imunidade que tenta fazer de tudo para expurgar o invasor.
O livro de Aldous já foi responsável por outras adaptações cinematográficas no passado como o telefilme americano de 1980 com 3 horas de duração e com um elenco formado por Kristoffer Tabori, Marcia Strassman, Bud Cort, Keir Dullea (2001) e Julia Cobb. Além de uma outra versão mais curta de 1988, com uma hora e meia de duração, com Tim Guinee, Rya Kihlstedt, Peter Gallagher, Patrick J. Dancy e Sally Kirkland.
Uma grande mudança da série em relação a história do livro, está na presença da Indra, um supercomputador que conecta a todos os habitantes da cidade através de lentes de contato com inserção neural, que permitem a visualização de dados, histórico e perfil social de cada pessoa que entra no seu campo de visão, nada muito diferente do que alguns aplicativos da internet não estejam conseguindo fornecer aos seus consumidores. Uma pequena diferença está no fato de que cada habitante consegue ter acesso ao campo visual de todos os outros, assim através do compartilhamento de imagens, cada um deles pode tentar experimentar as vivências do outros, praticamente um Facebook ou Tik Tok aperfeiçoado.
Uma crítica selvagem aqueles que acreditam piamente que a tecnologia e o progresso possam salvar a nossa sociedade, aos sistemas de produção, as sociedades divididas em castas, a necessidade quase obrigatória de atingirmos a felicidade ininterrupta, as drogas lícitas e ilícitas que tentam amortizar nossas dores, aos sistemas de monitorização de comportamento que impedem a privacidade e a idéia fixa que nós temos de que a perfeição pode trazer a felicidade.
Um livro do início do século passado que mostra que estamos sempre à beira do abismo sonhando em voar, mas esquecendo continuamente de como conseguimos subir até lá.
Crítica por: Fabio Yamada.
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