Crítica: Antes da Chuva

"ANTES DA CHUVA” - 1994

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Um dos filmes mais belos sobre a não linearidade do tempo. Uma fábula sobre a violência e a guerra, mas sobre tudo sobre a possibilidade de se escolher a vida. Uma obra-prima de Milcho Manchevski que utiliza os paradoxos temporais para falar sobre os sentimentos e contradições do homem.

O filme é dividido em três histórias. na primeira intitulada “Palavras”, um monge cristão ortodoxo Kiril (Grégoire Colin) que fez o voto de silêncio, abriga uma jovem muçulmana de origem albanesa Zamira (Labina Mitevska), que é acusada pela família de matar um parente. A gangue macedônica liderada pelo cristão Mitre (Ljupco Bresliski) faz um cerco ao templo. Kiril e Zamira tentam fugir, mas acabam sendo capturados e mortos.

Na segunda história “Rostos”, Anne (Katrin Cartlidge maravilhosa), uma editora de uma revista observa fotos de guerra, entre elas as fotos de Kiril e Zamira mortos. Anne vive um dilema entre escolher o marido e o amante. Durante um encontro com o marido, ela revela que está grávida, que o ama e que quer o divórcio.  Um garçom de origem albanesa é despedido após uma série de humilhações. Ele retorna ao restaurante cometendo um atentado no qual o marido de Anne morre e tem o rosto desfigurado.

Na terceira história “Imagens”, temos Aleksander (Rade Serdedzija fantástico), um fotógrafo correspondente de guerra que retorna ao seu país de origem, a Macedônia. Um país em meio a guerra dos Balcãs, onde irmãos tornaram-se inimigos. Aleksander descobre que seu primo Mitre deseja vingar a morte de um parente. A suposta assassina de origem albanesa é filha de Hanna, uma antiga paixão de Aleksander. Em meio a recordações do passado e as imagens da destruição da guerra, Aleksander decide proteger Zamira. Mitre acaba matando o primo Alexsander, no momento em que este protege a vida de Zamira. 

O filme poderia ser uma história linear, se não fosse alguns elementos injetados por Manchevski no meio da narrativa. O enterro de Aleksander acontece antes de Kiril fugir com Zamira. As fotos dos corpos do casal vistas por Anne, antes de falar com Aleksander, que ainda estaria vivo. O telefonema de Kiril para Anne, procurando por Aleksander, que teoricamente já estava morto e depois das fotos do corpo de Kiril serem tiradas. A chegada de Anne a vila da Macedônia, testemunhando a morte do amante Aleksander, cuja as fotos dos desdobramentos ela já vira antes de viajar. 

“O tempo não morre, o círculo não é redondo”. Essa fala que está presente nos três episódios aparentemente isolados da história do filme, simboliza que haverá pequenas digressões temporais que comprometem a sequência lógica e temporal das narrativas. No entanto, isso é uma metáfora para dizer que as histórias se repetem (no filme e na vida) e como círculo nunca se fecha, as posições (decisões ou atos) dos personagens nunca retornam a posição inicial. O que eu quero dizer é que o elemento humano (conhecimento ou vivências) torna-se uma variável viciosa, podendo modificar o desfecho de cada experimento ou acontecimento histórico.

O filme termina com o começo da chuva, que encharca o corpo de Aleksander aos pés de Zamira, seguido do plano em que Kiril está no mosteiro observando essa mesma chuva se formando.

Crítica por: Fabio Yamada. 

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