Crítica: Madeira e Água

"MADEIRA E ÁGUA " - 2021

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Um belo filme que tenta trabalhar a idéia de contrastes sem a necessidade inevitável do embate ou conflito. Uma ficção que se transveste de linguagem documental para captar uma realidade urgente afirmando se possível um caminho do meio ao estabelecer diálogo entre culturas, sociedades e realidades tão diferentes.

No filme de Jonas Bak sua mãe Anke (Anke Bak) faz o papel de uma senhora idosa alemã que acabou de se aposentar do trabalho de uma igreja em sua cidade. Ela marca um reunião de família com seus três filhos, mas seu filho Peter que mora em Hong Kong ficou preso na cidade devido aos protestos políticos recentes.

A primeira parte do filme apresenta a realidade vivida por Anke que vive em uma paisagem bucólica mas que se modificou com o tempo, com vários conjuntos residenciais tendo sido construídos na praia a qual frequentaram um dia. Através dos monólogos de Anke e de imagens do passado somos apresentados a rotina de vida de Anke quando jovem.

Insatisfeita com a ausência do filho, Anke decide viajar até Hong Kong para visitar o filho. A transição de um cenário para o outro através de uma sequência única simulando a passagem de um túnel do vilarejo germânico para a metrópole asiática é uma bela licença poética que mais uma vez faz alusão a esse contraste versus proximidade, onde lugares, coisas ou pessoas completamente opostas podem estar a distância de um pequeno túnel.

Anke, uma senhora com idade avançada viaja sozinha para essa sociedade completamente diferente da sua em meio a conturbados protestos políticos. Logo na chegada já sofre com o desencontro com o filho, não podendo ficar hospedada em sua casa, mas ela não se intimida e se hospeda em um hotel com quarto compartilhado. No quarto, ela conhece uma jovem ativista política com quem trava diálogos de diferentes visões de vida. 

Após conseguir se instalar no apartamento do filho, Anke conhece o porteiro local com o qual sai para almoçar e obtém algumas informações do filho que nunca aparece. Anke caminha sozinha pela cidade, onde observa os protestos que clamam por uma democracia política por entre os arranha-céus e ruas estreitas.

Anke faz alguns amigos durante sua curta ou passageira estadia, seja um leitor de tarô ou um senhor que lhe apresenta a cidade. Inclusive é nessa leitura de tarô que surge o nome do filme. Agora se pensarmos, que uma senhora idosa acostumada a tranquilidade do interior da Alemanha consegue entender o ponto de vista dessa sociedade chinesa conturbada e se aventurar sozinha em meio a protestos políticos intensos em outro país, como não conseguimos estabelecer um diálogo pacifico e inteligível com quem compartilha da nossa mesma realidade. 

Alguns podem criticar o filme por não ter um ponto de chegada ou uma direção única, mas a verdade é que o trabalho de Jonas Bak é uma travessia percorrida por essa protagonista de mente aberta por um mundo completamente do seu, mas com o qual consegue travar um diálogo produtivo. A viagem de Anke prova que madeira e água serem feitas de matérias completamente diferentes e não se misturarem, elas dependem uma da outra para sobreviverem,  o rio e a floresta. Uma podem se infiltrar na outra, irrigando ou produzindo a outra de forma simbiótica. Elas podem travar uma viagem tranquila com uma flutuando sobre a outra rumo ao mesmo destino.

Crítica por: Fabio Yamada.





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