Crítica: Los Inventados

"LOS INVENTADOS" - 2021

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Um filme que parte de uma premissa interessante que vai em contra-ponto a célebre frase: “Eu penso. Logo existo”. Aqui temos a idéia de que a nossa existência só se permite existir a partir dos olhos do outro. Um hipótese de que a vida só existe quando compartilhada, algo importante para tempos de pandemia e distanciamento social, mas acima de tudo onde o virtual toma lugar do real e avatares ou fake news tem mais valor que a própria verdade ou realidade.

O nosso protagonista da história é Lucas (Juan Grandinetti) um ator que trabalha em uma central de atendimento telefônico, mas que no passado fora uma criança prodígio de um programa de TV infantil. Em um de seus teste para atuação em comerciais, Lucas acaba conhecendo uma produtora de elenco por quem sente uma atração física imediata. Ele através dessa garota acaba decidindo embarcar em um retiro ou um workshop de atuação em uma fazenda afastada da cidade.

No tal retiro, o mentor do workshop propõe um experimento onde os integrantes terão que criar um personagem fictício e atuar como o personagem durante os quatros dias nos quais permanecerão isolados no retiro. Lucas está acompanhado de seu interesse amoroso, a produtora de elenco, mais dois rapazes e uma senhora com mais idade.

Cada um dos integrantes assume uma persona, que pode representar um desejo ou sonho de vida, uma estudante de música tímida, uma professora de geografia, um cientista, um biólogo e um residente de dermatologia. Este último, foi o personagem criado por Lucas, que a partir de agora na trama se chama Matteo. Os atores/ personagens convivem sem jamais saírem de suas criações, sendo que alguns deles se divertem desafiando os outros a se manterem dentro da atuação com perguntas cada vez mais capciosas.

Alguns críticos podem realizar comparações da produção argentina com outros filmes surrealistas, mas a questão aqui está muito mais para as metáforas construídas pelo roteiristas do que para um clima de mistério ou onírico, apesar do protagonista citar um sonho no meio da trama. Tudo já se inicia da profissão de cada um dos personagens que são atores fingindo terem outras vidas, criando avatares para si próprios e tendo o desafio de se manterem dentro dos personagens criados. Qual o objetivo disso? Por que nossa sociedade encontra-se envolta em vidas virtuais construídas em aplicativos recheados em sua maior parte de fotogramas milimetricamente maquiados, textos plagiados e narrativas cenográficas fictícias? O que não faltam são exemplos de fake news e perfis falsos apenas para conseguir mais cliques e likes nesse universo paralelo, desde o médico que inventa histórias sobre as crianças das quais salvou a vida, pessoas que morrem em busca da self perfeita ou indivíduos que desejam se tornar um ser virtual, os transumanistas.

Tento no exercício de representação, quanto no passado de sucesso do protagonista e no sonho  premonitório recorrente de Lucas, o ponto de intersecção é a idéia de que somente existimos a partir da visão do outro, seja através da imagem que o outro tem de nós, da imagem que construimos para o outro ou do sonho que representamos para o outro. Sempre seremos personagens satélites da vida ou imaginação de alguém, cabe a nós mesmo estabelecermos o quão próximo da verdade será a nossa representação ou atuação, correndo sempre o risco de deixarmos de existir se o foco de luz do olhar alheio não estiver sobre nós. Levando sempre em consideração que as máscaras que utilizamos para construir esses personagens são diametralmente opostas a luminosidade do olhar do outro, quanto mais camadas de mentiras utilizarmos, mais opaca e sem vida se tornará nossa vida.


Crítica por: Fabio Yamada.





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