"HIT THE ROAD" - 2021
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Existem alguns filmes que conseguem transmitir uma profundidade dolorosa a partir de imagens leves com personagens extremamente carismáticos, enganando o desavisado expectador que acreditar estar vislumbrando uma comédia de costumes mas quando na verdade está diante de um drama político e social.
Na história, escrita e dirigida por Panah Panahi (filho de Jafar Panahi) acompanhamos inicialmente de forma despretenciosa a viagem de uma família iraniana. Na cena inicial, um garoto (Rayan Sarlak, maravilhoso) está no banco de trás do carro do SUV debruçado sobre a perna engessada do pai (Hasan Majuni), que está adormecido. O garoto dedilha em cima de teclas desenhadas sobre o gesso, acompanhando a música incidental diegética, enquanto a mãe (Pantea Panahiha deslumbrante) está do lado de fora do carro e o filho mais velho (Amin Simiar) observa a estrada encostado no carro.
A primeira surpresa do filme ocorre a partir do fato do garoto estar levando um celular escondido dentro da calça, os pais o obrigam a entregar o celular a despeito de todas os apelos e desculpas do garoto. A mãe sai do carro, retira o chip do celular e o esconde em meio as pedras do deserto. Começamos a acreditar que essa viagem terá de tudo, menos um objetivo turístico.
As discussões dentro do carro entre todos os membros da família, com destaque para o garoto que tem tiradas fantásticas e luminosas, passam a idéia de que a família está fugindo de algo ou alguém. Estava quase esquecendo existe mais um personagem, o cachorro moribundo que está no porta-malas.
Através de metáforas e frases interrompidas ou silenciadas vamos descobrindo a interação entre os membros da família. O irmão mais velho tem um objetivo claro com a viagem, o pai faz de tudo para concretizar o objetivo do filho, a mãe sofre o tempo todo mesmo sabendo não haver outra saída e o filho mais jovem está alheio a tudo isso.
As imagens paradas com longas sequências silenciosas dão lugar a um cinema dinâmico com diálogos ferozes e cômicos. A fotografia e planos vão do simples e ordinário para sequências belíssimas com planos abertos com luz natural ou simplesmente iluminados pelos faróis de carros. O diretor ainda se dá a liberdade de se utilizar de efeitos de CGI numa bela sequência simulando uma viagem espacial em meio as estrelas com um saco de dormir que se transforma em um traje de astronauta. Tudo isso, fora as sequências icônicas de lip sync de Sarlak que ilumina a tela com a dublagem de canções iranianas bregas sobre as dores da perda.
Impossível não se emocionar com esse filme que por vezes pode até lembrar “Little Miss Sunshine” sem os exageros da sociedade americana de consumo, mas com a mesma carga emocional de uma família que também impulsiona o sonho de um filho que tem a simples necessidade da sobrevivência. As cenas musicais com o pequeno prodígio me fazem lembrar de outra viagem por um deserto a procura de algum tipo de redenção, “Priscilla - A Rainha do Deserto”. Revelando, que as vezes para emocionar o expectador, precisamos apenas de uma história interessante com personagens verdadeiros, mas se eles souberem cantar ou pelo menos dublar um canção emotiva, essas cenas perdurarão muito mais tempo na memória do público.
Crítica por: Fabio Yamada.
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